Dirigia-me à parada de ônibus costumeira na Estrada da Cacuia, quando senti uma brutal vontade de mijar. Fiquei apavorado. Para quem não sabe, mijar na rua dá cadeia, e a polícia carioca está de olho nos mijões - no último dia 9, prendeu três na Zona Sul e não é improvável que esteja em curso alguma ação na Ilha do Governador, onde moro. Antigamente era a maior moleza: em caso extremo, a gente corria para trás de uma árvore providencial, fingia não perceber o ar de reprovação dos transeuntes, e estava tudo certo. Era só não olhar muito para os lados ao guardar o boneco e seguir em frente, cabeça erguida, racionalizando o caso como um pecado venial. Nisso, as mulheres sempre levaram nítida desvantagem na hora do aperto, a menos que estivessem em grupos, voltando para casa depois de uma grande farra. Nos meus tempos de biriteiro e mijão de rua, fiz muita paredinha para essas companheiras de infortúnio. Hoje, são senhoras que regulam comigo em idade e têm verdadeiro pavor da minha memória de cronista. Na literatura, temos em Vidas Secas, de Graciliano Ramos, a mijada antológica de sinha Vitória atrás da igreja, e não me consta que tivesse arrumado encrenca com o soldado amarelo. Mas agora a ordem é prender os mijões, lavrar a ocorrência na delegacia e levá-los à presença do juiz. Pelo que declarou um policial, serão fatalmente condenados a distribuir cestas básicas ou a prestar serviços comunitários. Se querem saber, acho um exagero. Mijar na rua não é caso de polícia, é caso de banheiro público com o mínimo de asseio nos principais logradouros da cidade e de campanha nacional criativa, sem esculhambação moral. Quanto a mim, aflito como estava, mijei num terreno baldio ali perto, sob o olhar solidário de um cão sem dono.
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