É difícil definir com precisão o grande mal de todos os males. Cada um tem a sua relevância na desventura humana. Todavia, um que sempre está presente junto com todas as formas de manifestações maledicentes é a hipocrisia que, como está escrito no Livro do Gênese da Sagrada Escritura, consistiria simplesmente em professar algo pelo movimento de seus lábios e viver de modo contrário ao que se postula supostamente confessar. Nossa classe política e bem como todos os cidadãos que nela se espelham são um bom exemplo deste tipo de prática a qual, se desenvolve de uma forma deveras permissiva onde faz-se uso da imagem da desgraça alheia, do sofrimento da grande massa de desvalidos para assim justificarem a sua existência. Se exterminássemos com a indústria da miséria, bem provavelmente muitos políticos não saberiam sobre o que discursar em seus palanques. Muitos cidadãos não mais compreenderiam o porque da sua patética importância da sua participação na vida cívica de sua sociedade e, bem provavelmente, muitíssimos professores e escritores não mais saberiam sobre o que escrever e sobre o que ensinar, visto o fato de estes sustentarem a existência na tentativa pífia de supostamente explicar e hipoteticamente resolver as desgraças nacionais e outros, mais pretensiosos ainda, os da humanidade. Eles chamam a isso de "pensamento utópico". Outros simplesmente de "devaneios infantis". Outros, por sua deixa, simplesmente de charlatanismo, puro e simples. Mas, em todas as formas que utilizemos para denominar esse tipo de comportamento, encontraremos uma forte dose de hipocrisia. Não existe nada mais injurioso do que vermos nossa classe falante, para não dizer tagarelante, discursar e defender teses sobre o sofrimento da humanidade sem, na maioria das vezes, ter realizado algo simples que seja para resolver ou mesmo aliviar o sofrimento de um ser humano que viva próximo dele ou, quando não é o causador do sofrimento destes. Você, por um acaso, não é um deles? Se for, provavelmente não se reconhecerá, pois a desgraça alheia dá ótima prosa em fóruns de botequim e excelentes teses para pesquisa e - como poderíamos esquecer - ótima "plataforma" de politiqueiro mesquinho do interior metido a Estadista (apenas de não saber o que seja isso). Tal opção não se deve ao resultado gnosiológico que poderá ser obtido, mas pela sua fácil repercussão entre os outros que amam falar sobre as mazelas sem ao menos conhecê-las para assim, através da desgraça dos outros poder manter o seu status social.
Nota do Editor: Dartagnan da Silva Zanela é professor e ensaísta. Autor dos livros: Sofia Perennis, O Ponto Arquimédico, A Boa Luta, In Foro Conscientiae e Nas Mãos de Cronos - ensaios sociológicos; mantém o site Falsum committit, qui verum tacet.
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