Finalmente, o governo federal confirmou que pretende investir R$ 440 milhões em seis meses para recuperar 26,4 mil quilômetros de rodovias. Deste total, 7,2 mil foram declarados em estado de emergência na semana passada e poderão ter suas obras contratadas sem licitação. Os demais já estão contratados. A dispensa de licitação, embora legalmente autorizada em situações emergenciais, expõe a administração pública a grande risco. Não ocorre a ampla e transparente competição necessária para o Estado contratar as empresas que oferecerem o melhor preço com a qualidade requerida. E abre-se a conhecida brecha para favorecimentos escusos que acabam inevitavelmente sendo pagos pelos contribuintes. O perigo poderia ter sido evitado se a Cide (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico) tivesse sido integralmente aplicada nas suas finalidades desde 2001, quando foi criada; entre elas, está a recuperação da infra-estrutura de transportes. De 2002 a 2004, 41% dos R$ 22 bilhões arrecadados com a contribuição foram desviados para o alcance das metas de superávit primário e outras despesas. O dado é do Tribunal de Contas da União, que em novembro proibiu o uso da Cide em despesas administrativas. Com a decisão, o governo se comprometeu a atender a exigência do tribunal no Orçamento de 2006. Isso significa que o Executivo precisará se esforçar para não repetir o que aconteceu em 2005, quando apenas 54,5% do total arrecadado com a contribuição foram efetivamente aplicados, segundo cálculo da Confederação Nacional dos Transportes. Na semana passada, levantamento feito no Sistema Integrado de Administração Financeira pela liderança do PSDB na Câmara dos Deputados e divulgado pelo jornal O Globo, mostrou que os recursos não foram desviados apenas para a realização do superávit primário. A Valec, que constrói a Ferrovia Norte-Sul, utilizou-os para o vale-refeição dos funcionários. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários usou-os para pagar uma operadora de TV a cabo, o plano de saúde de seus servidores e serviço de limpeza. O Ministério das Cidades pagou empresas de fotografia e de comercialização de laticínios. A Companhia Brasileira de Trens Urbanos contratou empresa de produções artísticas. E a Agência Nacional de Transportes Terrestres comprou passagens aéreas. Ainda que tenham envolvido valores pequenos, estes são exemplos cabais de falhas na gestão pública que não podem mais se repetir. Mesmo nesta fase emergencial, o governo precisa cercar-se de cuidados, selecionando empresas idôneas, fiscalizando as obras e contratando por preços justos. Não é aceitável que, por serem de emergência, as obras se limitem à execução de remendos provisórios. A Cide proporciona recursos suficientes para a recuperação das estradas. Com a aplicação integral dos recursos da contribuição, espera-se um planejamento contínuo e a volta das licitações para as obras de expansão e recuperação de rodovias. Nota do Editor: João Claudio Robusti é presidente do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo).
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