Conheci Olavo de Carvalho em finais do século passado, na casa do Embaixador Meira Penna, nosso amigo comum. Foi um encontro para mim inesquecível, pois pela primeira vez eu me deparava com alguém radicalmente diferenciado em matéria de conhecimento, uma personalidade filosófica como jamais conheci, nem antes e nem depois daquele encontro. Só nos compêndios de filosofia é que eu poderia encontrar alguém semelhante. Conhecia-o à época de jornais e das polêmicas muitas que tem travado. E dos livros, em especial o impagável O IMBECIL COLETIVO. Exceto meu pequeno círculo de amigos, a começar pelo Meira Penna, todo mundo falava mal dele, um suposto direitista raivoso. Eu então tentava estudar, sem método e sem orientação, a vasta literatura filosófica e tartamudeava em seus temas. Não tive dúvida, tentei tirar do Olavo duas lições que obviamente, em um encontro de salão, ele não poderia me dar e eu aprender, pois a mim me faltava o elementar para aprender e a ele o tempo necessário para ensinar algo tão complexo. O primeiro tema foi a Astrologia, que eu estudara nos livros dos autores pagão, como Liz Greene, de quem li toda a obra, e Olavo me disse que o caminho desse conhecimento passava pela ortodoxia cristã. Quedei espantado, eu que por leitura e experiência sabia que o tema era de domínio, pelo menos de público, das seitas gnósticas não cristãs. O segundo tema foi ainda mais difícil. Pedi-lhe que me falasse de metafísica, que o fez muito relutantemente, pois sabia que eu estava por fora da discussão e pouco me adiantaria dez minutos de conversa. Ouvi interessadíssimo e nada aprendi sobre a matéria, infelizmente. Faltava-me a linguagem elementar. É na metafísica que as verdades religiosa e filosófica, aqui incluindo a científica, encontram-se, formando uma unidade indissolúvel. Deus, sem prejuízo de toda a verdade revelada, é acessível à razão e pela razão tem a sua realidade demonstrável. Lendo muito sobre o tema também descobri que os momentos da história de maior clareza do pensamento coincidiram com o apogeu da metafísica e o descenso com o seu abandono. A miséria da modernidade consiste precisamente nisso, em que a metafísica como disciplina foi abandonada. Em particular o século XIX, de Nietzsche e Kant, foi um retrocesso de milênios. Desde Descartes ou até antes, com Maquiavel, a modernidade consiste precisamente nesse afastamento voluntário da verdade. A miséria intelectual é tão grande que o vácuo da metafísica foi ocupado pelas teorias físicas. Hoje os sabidos, que desprezam a questão religiosa e metafísica, por conseqüência abraçam a ignorância, fazem o seu arremedo de filosofia apelando para a teoria do Big Bang, que é muito limitada como qualquer teoria científica em particular. E, ainda assim, ficam sem explicação alguma para o momento zero da suposta explosão original. Colocaram no lugar de Deus-Pai Todo Poderoso um formidável evento cataclísmico, cuja origem primeira ninguém se aventura a dar qualquer explicação. De fato, desconhecer Deus é algo deveras explosivo. O Big Bang é um grande nada como substituto da metafísica. Lembro tudo isso para citar a lição de metafísica que recebi do mestre Julián Marías, recém falecido, no seu singularmente belo livro HISTÓRIA DA FILOSOFIA. Está lá, à página 184: "Santo Tomás... demonstra a existência de Deus de cinco maneiras, que são as famosas cinco vias: 1- Pelo movimento: existe o movimento; tudo o que se move é movido por outro motor; se esse motor não se move, necessitará por sua vez de outro, e ainda ao infinito; isso é impossível, porque não haverá nenhum motor se não houver um primeiro, e este é Deus. 2- Pela causa eficiente: há uma série de causas eficientes: tem de haver uma primeira causa, porque, caso contrário, não haveria nenhum efeito, e essa causa prima é Deus. 3- Pelo possível e pelo necessário: a geração e a corrupção mostram que existem entes que podem ser ou não ser; tem que haver um ente necessário por si mesmo, e esse se chama Deus. 4- Pelos graus da perfeição: há diversos graus de todas as perfeições, que se aproximam mais ou menos das perfeições absolutas e por isso são graus delas; há, portanto, um ente que é sumamente perfeito, e é o ente sumo; este ente é a causa de toda perfeição e de todo ser, e se chama Deus. 5- Pelo governo do mundo: os entes inteligentes tendem a um fim e a uma ordem, não por acaso, mas pela inteligência que os dirige; há um ente inteligente que ordena a natureza e a impulsiona para seu fim e esse ente é Deus". Como se vê, é aqui em São Tomás um momento de apogeu da Civilização Ocidental, a civilização por antonomásia, a síntese do que de melhor nos legaram os gregos - em especial Aristóteles - e os pensadores cristãos. É o limite da compreensão do Homem. Desde Aquino que a humanidade mergulhou inexoravelmente para as trevas. Explicar a existência pela ignorância teria que acabar mesmo numa grande e destrutiva explosão. Se você é um jovem interessado nas verdades essenciais, leia o livro de Marías. E os do Olavo também. Então quando tiver a felicidade de encontrar o mestre Olavo terá os meios para dialogar filosoficamente com ele, para seu proveito. Faça-o antes que seja tarde. Nota do Editor: José Nivaldo Cordeiro é Executivo, nascido no Ceará. Reside atualmente em São Paulo. Declaradamente liberal, é um respeitado crítico das idéias coletivistas. É um dos mais relevantes articulistas nacionais do momento, escrevendo artigos diários para diversos jornais e sites nacionais. É Diretor da ANL - Associação Nacional de Livrarias.
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