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Opinião
29/01/2006 - 13h25
Tabu mercantilista
João Luiz Mauad - MSM
 

A riqueza nada mais é do que o conjunto de bens e serviços que alguém possui, seja esse alguém um indivíduo, uma família, uma empresa, um país. Assim, a riqueza se constitui de coisas tais como: roupas, alimentos, eletrodomésticos, móveis, utensílios, máquinas, equipamentos, veículos e quaisquer outras produzidas para o consumo ou investimento. Dizemos que fulano é rico quando possui muitas dessas coisas e, inversamente, pobre na medida em que tem dificuldade para adquiri-las. Por seu turno, um país será rico quando seus cidadãos e empresas tiverem esses bens e serviços em abundância e pobre quando eles forem escassos.

Em nossa vida diária, tomamos com naturalidade o fato de que toda a atividade econômica dos indivíduos - trabalho, produção, prestação de serviço - é somente um meio para o fim de satisfazer nossas necessidades de consumo, como alimentação, vestuário, serviços de saúde, lazer etc. "O consumo", como escreveu Adam Smith, faz mais de dois séculos, "é o fim e único propósito de toda a produção". Apesar disso, tornou-se um lugar-comum considerar a atividade de "consumo" como se fosse algo menos desejável, menos importante em termos econômicos, do que a "produção". Com raríssimas exceções, quase tudo o que lemos e ouvimos atualmente nos leva a imaginar que o ato de "vender" é melhor do que o de "comprar", que "exportar" é sempre melhor do que "importar". Quantas vezes o estimado leitor já não se deparou com a indefectível censura à "sociedade de consumo" norte americana? Ou com o vaticínio de que o "consumismo" deles será a ruína do "império"?

No comércio internacional, motivada por um extemporâneo raciocínio mercantilista, essa é uma tendência evidente. Recentemente, durante a reunião da OMC em Hong Kong, assistimos, mais uma vez, intensos e descabidos debates, em que cada qual defendia as suas posições partindo da falsa premissa de que baixar impostos de importação constitui uma espécie de concessão aos inimigos, perdendo de vista que barreiras comerciais são, na verdade, muito mais um prejuízo para os consumidores e, conseqüentemente, para a nação que as impõe do que para os exportadores estrangeiros.

Por alguma razão que já vem de longe, na equação algébrica que resume as contas de comércio internacional de qualquer país, às exportações aplica-se o sinal positivo, enquanto às importações está reservado o sinal negativo. Dessa forma, quando as exportações superam as importações, diz-se que a balança comercial é positiva e vice-versa. Como esse padrão foi estabelecido de forma arbitrária, nada impediria que ele fosse diferente.

Qualquer um de nós, quando vende um bem de sua propriedade, está ficando mais rico pelo simples fato de trocar esse bem por certa quantia em dinheiro? É óbvio que não. Seria muito fácil acabar com a pobreza do mundo se a simples posse de papel moeda ou qualquer outra forma de dinheiro significasse riqueza. Bastaria que os governos "fabricassem" bastante dinheiro e todos os problemas da humanidade estariam solucionados. O problema é que não podemos vestir dinheiro, comer dinheiro, calçar dinheiro. Não consumimos dinheiro, apenas utilizamo-lo como forma de facilitar as nossas atividades de troca. Ele nada mais é, portanto, do que um meio, e não um fim em si mesmo, como insistem em querer nos fazer acreditar.

Saindo da lógica mercantilista, que enxerga o dinheiro como o objetivo e as mercadorias e serviços como meios de obtê-lo, veremos facilmente que são as importações que contribuem efetivamente para aquisição e geração de riqueza, não o contrário. Um país se torna "mais rico" quando entram em suas fronteiras produtos e serviços e não quando estes saem. A saída é um custo, enquanto a entrada é o verdadeiro benefício. Sobre isso, vale lembrar os ensinamentos oportunos de Milton Friedman:

"Outra falácia raras vezes posta em questão é a de que as exportações são boas e as importações são ruins. A verdade se revela muito diferente disto. Não podemos comer, vestir ou gozar dos bens que enviamos ao exterior. Consumimos alimentos provenientes da América Central, calçamos sapatos italianos, conduzimos automóveis alemães e assistimos a programas em televisores japoneses. Nosso ganho com o comércio exterior está no que importamos. As exportações constituem o preço que pagamos para obter as importações. [...] o benefício para os cidadãos de determinado país está na obtenção do maior volume possível de importações, em troca das suas exportações. Em outras palavras, de exportar o menos possível para pagar as suas importações".

No frigir dos ovos, quanto maior é o superávit comercial, menor será o volume de investimentos no país, já que o saldo positivo na balança de comércio e serviços nada mais é do que "exportação de poupança".

O Brasil acaba de anunciar, com direito a bumbos e fanfarras governamentais, um saldo comercial recorde de aproximadamente 45 bilhões de dólares. Já o balanço de pagamentos, que inclui, além do superávit comercial, os saldos das transações por conta de viagens internacionais, transportes, seguros, remessas de juros (da dívida externa), lucros, dividendos, dentre outras, foi de 18,8 bilhões de dólares, conforme dados do Banco Central. Ora, como não transacionamos internamente com a moeda americana, esse excesso de divisas é lançado na conta das nossas reservas internacionais (que nada mais é do que poupança) e acaba sendo remetido para outros cantos do planeta, na forma de "investimentos", normalmente títulos emitidos por outros governos.

Ora, se no lugar de entesourarmos esse excesso de divisas, na forma de títulos estrangeiros, tivéssemos utilizado parte dele para importar produtos, matérias primas, máquinas, equipamentos etc., certamente estes bens estariam, nesse exato momento, multiplicado o seu valor dentro de nossas fronteiras, ou seja: gerando mais riquezas e empregos internamente. Isto porque, com certeza, eles estariam sendo consumidos, transformados ou estariam produzindo outros bens ou serviços que, ao final do ciclo, provavelmente valeriam muitas vezes mais que os juros obtidos com os depósitos no exterior.

A ilusão de que o superávit comercial é intrinsecamente bom e o déficit, por sua vez, indesejável, só é possível porque as pessoas não costumam pensar no seu próprio dia-a-dia. Por exemplo: a maioria de nós compra muito mais do que vende ao padeiro, ao quitandeiro, ao açougueiro, ao livreiro e assim por diante. Isso não nos faz menos prósperos do que eles. Eu jamais vendi qualquer coisa ao meu barbeiro ou ao garçom a quem dou gorjetas diariamente. Ao contrário, em nossas transações o caminho do dinheiro é sempre do meu bolso para o deles. No entanto, esse fato não os faz mais ricos do que eu. Simplesmente, porque o que conta é a produtividade de cada um ou, em outras palavras, a nossa capacidade individual de geração de riquezas (bens ou serviços).


Nota do Editor: João Luiz Mauad é empresário e formado em administração de empresas pela FGV/RJ.

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