Desde que a Cetesb começou a avaliar as praias paulistas, nos anos 70, Ilhabela sempre foi reconhecida como campeã de águas limpas. As bandeiras vermelhas apareciam raramente, como conseqüência de períodos exageradamente longos de chuvas fortes - uma fatalidade que enchia as praias de lama e turvava a água do mar e das cachoeiras. A situação, que era rara, tornou-se comum ao longo dos últimos anos. A equação tinha resultado previsível, dadas as suas variáveis: explosão do turismo, crescimento da população e falta de planejamento. Em 2005, apenas nos meses de abril e agosto as praias de Ilhabela não tiveram nenhuma bandeira vermelha e das onze praias avaliadas apenas três (Feiticeira, Grande e Curral) estiveram próprias o ano todo. Esforços importantes têm sido feitos no sentido de reverter essa situação. A implantação da rede de esgoto em alguns bairros de Ilhabela deve melhorar a condição das praias e das cachoeiras. E, como todos sabemos, o poder público municipal é apenas um dos personagens da história das águas ilhabelenses. Contudo, as bandeiras da Cetesb são um lembrete para os políticos da cidade e para os planejadores do turismo, que às vezes parecem esquecer de fatos simples e importantes: - Ilhabela tornou-se uma importante cidade turística graças à qualidade de suas águas. A Capital da Vela não existiria com águas sujas, apesar dos ventos generosos e constantes. Praias e cachoeiras só interessam ao turista quando têm águas limpas. - Águas poluídas não são apenas uma questão de saúde pública e de saneamento, são também uma questão financeira. Em Ilhabela a água não é apenas fonte de vida, mas também o combustível da economia local. - O turismo é uma atividade econômica paradoxal: ela surge e desenvolve-se onde há recursos para isso e, à medida que cresce, ela tende a danificar e esgotar esses recursos mesmos, o que cedo ou tarde pode extinguir o próprio turismo ou torná-lo decadente. Toda a história do litoral paulista confirma essa afirmação. - A cobrança de uma "taxa ambiental", uma das principais pautas do poder público ilhabelense para 2006, embora possa ajudar a atenuar os problemas causados pelo turismo, não atinge o cerne do problema que pretende resolver, tampouco interfere na questão da qualidade das águas. Isto faz pensar em duas coisas: primeiro, que os recursos hídricos deveriam ser a prioridade permanente de qualquer político ou planejador de Ilhabela; segundo, que o dinheiro ajuda a diminuir problemas, mas não os resolve. Àqueles que são avessos a temas ambientais lembro que não se trata de uma proposta "ecochata", mas de uma questão sócio-econômica fundamental para a sobrevivência do município. Ainda que hoje ela possa não ser urgente, cachoeiras secam e praias não podem suportar todo o esgoto que Ilhabela pretende produzir nos próximos anos. Se não for um exercício asqueroso demais, tentem imaginar o esgoto produzido por cerca de 60 mil pessoas; este foi o número aproximado de turistas que vieram a Ilhabela no reveillon. Algo precisa ser feito. A não ser, é claro, que os políticos e empresários de Ilhabela gostem da idéia de transformar o lugar num pólo industrial ou algo do gênero - é sempre mais fácil fingir que o patrimônio ambiental não existe.
Nota do Editor: Christian Rocha vive em Ilhabela, é arquiteto por formação, aikidoka por paixão e escritor por vocação. Seu "saite" é o Christian Rocha.
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