Ler jornais velhos é exercício interessante porque se nota que muitas previsões foram apenas palpites que não deram certo. Constata-se que não existem fatos, mas versões. Comprova-se que liberdade de imprensa é algo relativo. Experimentem, caros leitores, passarem os olhos nas notícias de uma semana, quinze dias, um mês atrás e se surpreenderão com contradições, desencontros, inverdades contidos em matérias e notícias. Fulano vai depor, fulano não apareceu para depor. O deputado x vai ser cassado, não vai ser mais, vai renunciar. A candidatura do presidente afundou na lama e sua reeleição está perdida, seu segundo mandato está garantido. Fulano de tal está à frente nas pesquisas, fulano perdeu a eleição. Sobretudo, agora, quando além do único candidato-presidente já se delineiam outros postulantes, especialmente os dos principais partidos, e o tempo parece correr mais rápido em direção a outubro, explodem lendas e crendices de campanha enquanto balões de ensaio de candidaturas povoam os céus da política. Nesse cenário de eloqüências acelera-se a guerra de palavras expressa em elogios ou ataques. Multiplicam-se as pesquisas, essas peças preciosas de campanha que muitas vezes tentam arregimentar votos para este ou aquele candidato. No momento recrudesce a propaganda governamental a partir de obras faraônicas inauguradas no papel e algumas bondades não praticadas em três anos. Especialmente o PT e seu eterno candidato Luiz Inácio apostam no esquecimento popular das más notícias. Para eles a corrupção desapareceu nas páginas amarelecidas dos jornais velhos. E tem mais: eles sabem que brasileiro para valer quase não lê jornal, mas apenas assiste TV, não desiste nunca de ganhar a copa do mundo e é fã do Big Brother Brasil. Por falar nisso, sem dúvida José Dirceu, Delúbio Soares, Silvinho Land Rover, Waldomiro Trem Pagador, o assessor da cueca cheia de dólares, tantos outros membros do PT mais ou menos importantes e seus auxiliares como Marcos Valério, além da base aliada dos mensalistas, fariam imenso sucesso num Big Brother PT. Imagine-se expostos ao público, sem "imprecisões terminológicas", (termo usado pelo ministro Palocci para substituir a palavra mentira), seus jogos, tramas, trapaças, acusações, intrigas como fazem os participantes do programa da Globo. E olha que os BBB, assim como tantos petistas, saem do nada de sua insignificância para a fama e a glória, com oportunidades de sucesso que nenhum pós-doutor depois de anos de estudo e esforço pode sequer sonhar. O Big Brother Brasil faz sucesso porque, convenhamos, é a consagração do mau-caratismo tão caro à cultura nacional dos antivalores. Afinal, estamos longe de ser uma meritocracia na qual vencem os melhores. No Brasil a preferência vai para os coitados ou os que se dizem coitadinhos. E aí está mais um dado que poderá ajudar a manter Lula lá. Enquanto o clima eleitoral vai dominando o noticiário, o presidente voa sem medo de ser feliz no seu aerolula de US$ 56,7 milhões, que teve o bar reformado ao custo de R$ 300 mil, em que pese o ministro Furlan ter anunciado que o presidente não bebe há quarenta dias. Mas, o que importa é manter no imaginário popular um presidente pobre coitado, o proletário defensor dos oprimidos. Foi dada a largada rumo ao prêmio máximo da política e o clima mental das ilusões e das persuasões vai se adensando. Enquanto isso, erros são cometidos novamente pelo PSDB, partido tido como mais apto para enfrentar o PT. Aquela idéia de deixar sangrar o presidente da República (que se supunha abatido pelos escândalos de corrupção) em vez de pedir seu impeachment, pode agora se mostrar desastrosa. Serve também para críticos e adversários dos tucanos os acusarem de ter protegido Luiz Inácio e serem coniventes com o PT. E no momento a demora do PSDB em definir seu candidato ajuda o candidato-presidente a subir nas pesquisas, porque, enquanto as intenções de votos se concentram em Luiz Inácio, seguem dividas entre Serra e Alckmin. O mesmo acontece com o PMDB no caso Rigotto/Garotinho. A diferença entre este partido e o PSDB reside no fato de que o PMDB, que ao mesmo tempo é situação e oposição, poderá ainda optar pela vice-presidência na chapa de Luiz Inácio, apesar das negativas dos peemedebistas de oposição. Em todo caso, seus possíveis candidatos também dividem a opinião pública concentrada num benfazejo Papai Noel que promete bondades sem conta e obras faraônicas que só precisam de mais tempo de governo do PT e da paciência do povo. De todo modo, se no Big Brother os resultados parecem pré-estabelecidos, a política é por demais mutável e fica difícil saber com antecedência quem ganhará. Muitos prognósticos de hoje ficarão apenas nas páginas amarelecidas dos jornais velhos. Nota do Editor: Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
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