Estou escrevendo no computador e ouço um choro. É a minha secretária esvaindo-se em lágrimas. Recebera um telefonema. Seu pai acabara de morrer. Perguntei a idade. Era mais novo do que eu. Fico meio apavorado. Fumava e bebia muito, ela disse. E aí lembrei do meu amigo poeta ao me passar recado de seu cardiologista, amigo comum, dizendo que ele, o poeta, não era hipertenso. Não era, mas será, certamente. Será, pela simples razão do corpo pedir respeito. Pede com jeito: não coma demais, trabalho muito por conta disso. Pede com calma: não beba exagerado, veja seu fígado e as conseqüências para os rins. O amigo poeta, muitas vezes, não respeita seus limites. O corpo pede: vá dormir, e ele fica madrugada afora, catando insônia. Minha secretária continua chorando. O pai morava longe e lá se vai ela. Liga para a mãe e o choro fica mais controlado. Consola a mãe e diz: logo estará chegando. Enquanto ela agora deve estar em uma dessas BRs esburacada, lembro do meu amigo cronista-psi tossindo feito um condenado. Tosse por fumar em demasia. Sabe disso e não cuida, mas diz preocupar-se quando a minha pressão ascende ao bom ou ruim futebol do meu time. Continuo lembrando haver o pai da secretária morrido de infarto, mas invento, para mim: ele só morreu porque fumava e bebia. Todos morrem, nada a ver. E aí lembro do amigo-editor, meio adoentado, semana dessas, por haver recebido um catatau de exames laboratoriais. Todos estavam bem, exceto um, o do colesterol e isso deve ter mexido com a cuca dele, e aí a pressão disparou e ele foi descansar em casa, de castigo. Pensa ser de ferro. Não é. Tem de se cuidar. Há centenas de lançamentos de autores vários, estreantes, repetentes ou delirantes, a serem feitos e só ele sabe cuidar disso com o seu jeito de quem não quer nada, mandando e-mails, correspondência com convite para todo mundo, telefonemas lembrando o compromisso e levando uísque para molhar o bico dos amigos. Tudo boca-livre. Ele é assim. Estou lembrando também de outro poeta, ora virando memorialista, a comer de forma pantagruélica. Come de ficar triste e vai embora. Come menos, cara. Lembro de outro amigo que se zanga facilmente. Para com isso,você sofre. Lembro de tanta coisa, mas não esqueço das nossas vidas, responsáveis e, quiçá, inconseqüentes. A vida precisa ser cuidada. Ouviu, pessoal?
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