Em 11/02, o Financial Time publicou matéria sobre isenção de impostos sobre investimentos estrangeiros no Brasil. O plano teria como objetivo canalizar recursos para o setor público permitindo uma grande queda dos juros por oferta competitiva de capital externo. Em 16/02 a notícia foi dada no Brasil de forma simplificada nos canais de televisão, e no dia seguinte apareceu nos principais jornais. Segundo O Estado de S. Paulo, "os investimentos estrangeiros estão liberados do pagamento do Imposto de Renda nas aplicações em títulos públicos e nos fundos de capital de risco que investem em empresas da área de tecnologia. A Medida Provisória 281 publicada no Diário Oficial, em 16/02, também prevê a isenção da CPMF nas emissões de ações novas e aumento de capital de empresas em operações realizadas fora da Bolsa de Valores". Como se nota, este é mais um paradoxo de um governo e de um partido, o PT, ditos de esquerda, que invariavelmente acusam os adversários de serem de direita e cujos economistas, enquanto estavam na oposição, clamavam por cobrança de imposto sobre o "maldito capital estrangeiro que só pensa em tirar proveito do Brasil". Como os petistas são exímios em produzir eufemismos semânticos, por exemplo, "recursos não contabilizados" significando caixa dois, dirão que os privilégios aos estrangeiros fazem parte de seu marxismo de mercado. Como era de se esperar, a medida já está provocando polêmica entre os investidores nacionais que não foram agraciados com os mesmos benefícios, mas nenhum nacionalista, nem de direita nem de esquerda, levantou a voz. Como economia e política são indissociáveis, os privilégios ao capital internacional provocarão impacto na campanha eleitoral. E enquanto o PSDB discute qual candidato lançar, o governo petista joga pesado, esperando recolher os louros de sua cartada na economia para alavancar ainda mais a reeleição de Luiz Inácio. Se tudo der certo o capital estrangeiro entra de forma abundante e os juros despencam sem que o governo tenha que fazer ajuste fiscal, podendo, então, se atirar com prazer à gastança eleitoreira, com o detalhe de uma cavalar valorização do Real. Espera-se, porém, que a moeda rapidamente se reajuste, uma vez que os juros baixos diminuiriam sua atratividade. Existe, é claro, o risco do câmbio não se ajustar rapidamente e as exportações, que são apresentadas como grande trunfo do governo e não geradas pelo esforço de empreendedores particulares, despencarem. Nesse caso os juros teriam que subir novamente para evitar crise cambial. De todo modo, como em campanha vale tudo, o risco começa a ser corrido. Quanto aos empresários, é preciso lembrar que os mais recentes dados sobre emprego e renda do trabalhador industrial foram negativos, o que reflete a queda da produção industrial. A diminuição dos juros, tão reivindicada pelos companheiros capitalistas, poderá reanimar a produção com boas conseqüências para patrões e trabalhadores. Assim, se tudo alcançar a tempo a repercussão desejada no apagar das luzes desse mandato, poderá garantir o segundo com respaldo do capital e do trabalho. Isto é claro, se algum fato novo não acontecer. Lula de novo lá, PT lá novamente, pois de fato é impossível dissociar Luiz Inácio de seu partido e de seu governo, conforme é apresentado estrategicamente. Por isso foi animadíssima a festa dos 26 anos do PT e os participantes foram ao delírio ao ouvirem o resultado da pesquisa CNT/Sensus. Ali estava a volta por cima com a ascensão miraculosa do candidato-presidente. Este absolveu os companheiros de seus pecadilhos, porque errar é humano, e comemorou-se num pantagruélico banquete fome-zero a impunidade, a corrupção, o mensalão, os dólares na cueca, o caixa dois ou "recursos não contabilizados", enfim, todas as "as piadas de salão", como disse o risonho Delúbio Soares. Certamente, o grupo mais elevado e restrito da hierarquia governamental já estava comemorando as isenções ao capital estrangeiro, que nunca foi tão bem tratado em toda nossa história por um presidente. Outro recorde de Luiz Inácio que sempre se vangloria do ineditismo de seus feitos. Se a proverbial incompetência do PT não atrapalhar o "milagre econômico", também abençoado pela paradisíaca conjuntura externa, quem sabe o PMDB entra mesmo de vice na chapa de Luiz Inácio, ou lança candidato de mentirinha como o foram Ulysses Guimarães e Orestes Quércia. Nesse cenário, resta ao PSDB e ao PFL, que tiveram a chance de tomar o bonde da história e o perderam quando não pediram o impeachment na hora certa, aprender em tempo recorde ser oposição. Mas para piorar, parece que meia dúzia de caciques tucanos vai cometer o erro fatal de escolher José Serra em vez de Geraldo Alckmin. De todo modo, qualquer um destes vai precisar tirar a camisa de renda e vestir armadura. A luta não vai ser fácil contra a esquerda de conveniência escudada por seu marxismo de mercado. Nota do Editor: Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
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