Sim, parece irônico, mas aos poucos, com uma vontade inédita na história do País, Lula da Silva vai criando os dez milhões de empregos prometidos na campanha de 2002. No entanto, é bom esclarecer: dentro do setor público e nas hostes empresariais do governo. De início, com o apelo estratégico à terceirização, o grande esquema manipulado pelos políticos (e tecnocratas) para se atingir o Nirvana, sem que aparentemente os índices estatísticos tornem mais alarmante o frenético inchaço da máquina estatal. Senão, vejamos: só na Petrobrás, a empresa está somando hoje mais de 40 mil empregos terceirizados. Um pouco menos, no Banco do Brasil, com a invenção do Banco Popular do Brasil (destinado a "empréstimos para o público de baixa renda", com um prejuízo, segundo declarações recentes do Sr. Robson Rocha, seu presidente, de R$ 47,6 milhões), e na Caixa Econômica Federal, ambos com cerca de 30 mil funcionários terceirizados, estagiários ou empregados "temporários". A terceirização é significativa até mesmo num obscuro Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional. Por sua vez, a empresa estatal Furnas Centrais Elétricas está sendo investigada pelo Ministério Público do Trabalho pela terceirização irregular de dois mil funcionários, com negócios que se avolumam em mais de R$ 800 milhões junto ao grupo Bauruense, denunciado por Roberto Jefferson, na CPI dos Correios, como um dos financiadores do propinoduto formado pela dupla Marcos Valério e Delúbio Soares - este, corrupto, mas diligente ex-tesoureiro do PT. Um vastíssimo contingente de terceirizados também integra a folha salarial dos Correios e Telégrafos, dos 35 ministérios e das 34 empresas estatais criadas pelo governo Lula para atender a permanente "demanda" de setores voltados para energia, bancos, petróleo, gás etc. Não há porque fazer cara de espanto. Logo em 2003, quando chegou ao Planalto, Lula da Silva afirmou que o seu objetivo no governo era recriar um Estado forte, pois - garantia - "uma máquina pública bem profissionalizada e bem formada arrecada mais, presta serviços de melhor qualidade, combate o desvio de recursos, produz mais e transforma os serviços prestados pelo o Estado em serviços competitivos com qualquer outro país do mundo". Em cima de tal falácia, de imediato o ex-operário preencheu com os necessitados companheiros do PT cerca de 19 mil cargos de confiança, de custo médio em torno de R$ 3 mil reais. Nos anos seguintes, o presidente ampliou em mais 18 mil o número de apaniguados do partido dentro dos variados espaços oficiais, incluindo-se o próprio Palácio do Planalto. Tudo sem falar nas centenas de ONGs mantidas pelos dinheiros públicos, em geral verdadeiros cabides de emprego e muitas delas nicho do pior parasitismo "politicamente correto". Não satisfeito com o grande número de empregos terceirizados, que ocupam hoje no Brasil mais de 2 milhões de funcionários distribuídos entre empresas privadas e setor público, e mesmo considerando os "concursos públicos um privilégio para os que estão mais bem preparados", Lula da Silva anuncia, neste revigorado ano de campanha presidencial, a realização de concursos públicos que objetivam incorporar 10 mil novos funcionários à já saturada máquina do Estado, sem falar em milhares de vagas abertas na Petrobrás, e outras tantas na malfadada Furnas. A última jóia, por ato de medida provisória, ficou por conta da criação de 2.558 "vagas" na Fiocruz e em outras preciosidades da Coroa, com destaque para 400 cargos no Itamaraty, com salários invejáveis. O Brasil de Lula está gastando R$ 105 bilhões com pagamento do funcionalismo e R$ 250 bilhões com os aposentados, dos quais 42% do numerário contemplam o setor público - o que acarreta um rombo na Previdência na ordem de R$ 1 trilhão e um déficit anual na ordem de R$ 38 bilhões. No orçamento de 2005, por exemplo, mais de 96% das receitas estavam comprometidas com o pagamento de pessoal, Previdência, transferência para Estados e municípios, saúde e educação, sem falar no custeio da máquina pública, que é assunto tabu. Resultado: embora o PIB esteja sendo avaliado em R$ 1,94 trilhão, o governo monopolizador se apossou de cerca de 40% desta cifra - o que resulta numa das maiores cargas tributárias da nossa história, ainda assim considerada insuficiente: por força de gastos, endividamento e pagamento de juros, o Banco Central acaba de revelar um estoque da dívida pública mobiliária interna que ultrapassa a espantosa soma de R$ 1 trilhão. Diante de um quadro de perfil insolvente, a denunciar o espectro da estagnação, a própria ONU prevê para o Brasil, em 2006, a pior taxa de crescimento da América Latina: algo entre 2,6% e 3%. Por outro lado, um estudo da New Economics Foundation, instituição de pesquisa londrina, calcula que, neste ritmo, o Brasil levará mais de 3 séculos para se equiparar aos países desenvolvidos, em que pese o inquestionável crescimento da economia mundial. Uma das mais árduas tarefas para quem substituir a "experiência Lula" será, sem sombra de dúvida, a de desaparelhar o Estado "forte" montado na esteira do pensamento estatizante preconizado pelos ideólogos do petismo. Ela implica em desmontar todo um sistema ineficiente e corrupto comprometido com a visão da riqueza social como uma cornucópia do poder público a ser espoliada em proveito próprio, sob pretexto mendaz de se combater às desigualdades e se buscar a justiça social. De fato, será uma tarefa difícil e que muitos consideram uma missão impossível. Nota do Editor: Ipojuca Pontes é cineasta, jornalista, escritor e ex-Secretário Nacional da Cultura.
|