Durante muito tempo, os exames escolares serviram principalmente para que as escolas avaliassem os estudantes. Agora, com o Enem, Exame Nacional do Ensino Médio, as próprias escolas estão sendo avaliadas e colocadas num ranking, de acordo com os resultados obtidos por seus alunos. Alguém poderia perguntar até que ponto um exame avalia o nível de conhecimento ou o nível do estabelecimento de ensino; é uma polêmica que volta todos os anos na véspera do vestibular. A verdade, porém, é que a nota é um número - e números, com todas as suas imperfeições, são a maneira mais simples, mais prática e mais rápida de avaliar. Alguns dos resultados obtidos no Enem eram previsíveis. Por exemplo, a média nacional das escolas privadas é superior à das escolas públicas, que lutam com dificuldades de recursos, com a má remuneração dos professores, com a carência dos alunos, em geral mais pobres. Mas há também um dado interessante. Das 27 melhores escolas públicas, segundo o Enem, seis são colégios militares, incluindo o de Porto Alegre, com uma das maiores médias (70,63 contra os 40,25 que representam a média nacional no setor público). Não sei quantas são as escolas públicas, nem quantos colégios militares existem, mas certamente eles estão super-representados. E aí vem a pergunta: por quê? A resposta, naturalmente, demandaria um estudo mais amplo, mas vou arriscar um palpite: acho que pesa, neste caso, uma coisa chamada disciplina. Que, no passado, era coisa aterrorizante. Até recentemente, as escolas inglesas ainda admitiam chicotear os alunos, e nós tínhamos a palmatória. Mais: o Brasil passou por um período ditatorial que, entre outras coisas, serviu para nos dar aversão ao autoritarismo. Agora: existem dois tipos de disciplina, aquela que é autoritária, enfiada goela abaixo nas pessoas, e aquela que resulta da compreensão da necessidade de um esforço sistemático para atingir qualquer objetivo, seja ele aprender a jogar futebol, tocar um instrumento musical ou entender uma fórmula matemática. Esforço, porém, é uma palavra que adquiriu conotação negativa, sobretudo em uma sociedade não raro permissiva, como é a nossa. E os professores freqüentemente se transformam em bodes expiatórios da revolta de jovens; até casos de agressão são registrados. Precisamos, portanto, recuperar a noção de disciplina como algo necessário. Mas é possível à escola proporcionar as condições emocionais para que os alunos se incorporem a este esforço de maneira espontânea, de maneira agradável e de maneira gratificante. Um desafio tão grande quanto conseguir boas notas no Enem.
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