Existe um processo em marcha que poucos se dão conta: o fortalecimento do Executivo que se sobrepõe aos desgastados Poderes Legislativo e Judiciário. Com relação ao Judiciário, destaque-se sua instância mais elevada, o Supremo Tribunal Federal, onde paradoxalmente têm prevalecido julgamentos políticos que beneficiam os interesses do atual governo e não decisões baseadas na Lei. Mesmo quando resolve sobre questões legais o STF produz estupor, como no caso dos crimes hediondos. Inspirados na idéia do ministro Thomaz Bastos, os ministros do STF concederam a estupradores, homicidas, corruptos, torturadores, traficantes, seqüestradores, terroristas o direito ao regime de progressão da pena em caso de bom comportamento, permitindo assim aos facínoras da pior espécie passar do regime fechado ao semi-aberto. Humanitários com os criminosos os ministros foram desumanos para com os cidadãos honestos. Mais uma vez se conclui que no Brasil direitos humanos são para os bandidos. Note-se que as proteções legais estão ao tal ponto deterioradas, que a família do prefeito petista assassinado, Celso Daniel, está tendo que deixar o país por conta de ameaças sofridas. Coincidentemente estas ameaças começaram depois das denúncias que os irmãos de Celso Daniel fizeram de membros importantes do governo na CPI dos Bingos. Quanto ao MST, que deflagrou nova onda de vandalismo em vários Estados, permanece impune. Respaldado pelo governo do PT que tem nesse movimento sua porção guerrilheira, os chamados sem-terra sabem que nada lhes acontece mesmo quando de forma criminosa investem sobre o horto florestal da Aracruz Celulose, no RS, destruindo laboratórios e pesquisas de mais de vinte anos, e cinco milhões de mudas de eucaliptos numa ação que se pode classificar de terrorista. Mas como disse o presidente Luiz Inácio, "o MST é um movimento sério". Já o Legislativo vai se tornado cada vez mais desacreditado desde que os mensalistas eclodiram na mídia. Até agora foram cassados apenas José Dirceu, chamado de chefe do mensalão, e Roberto Jéferson, que denunciou a compra dos deputados pelo governo, além de outras falcatruas. E enquanto a sociedade espera mais cassações, os deputados, assim como o presidente Luiz Inácio que perdoou as "piadas de salão" de seus correligionários, praticaram mais uma boa ação. Depois de salvar Sandro Mabel (PL) e Romeu Queiroz (PTB), no dia 9 deste absolveram os colegas Roberto Brant (PFL) e Luizinho (PT). O deputado Luizinho deve ter obtido a piedade de seus pares quando certa vez se defendeu dizendo que não se pode condenar com o mesmo rigor um grande ladrão e um batedor de carteiras. Desse modo o petista proletarizou seu crime tornando-o humilde e atraiu simpatias que, aliás, já tinha do companheiro presidente da República. Coitado do Luizinho recebeu pouco mensalão via Marcus Valério, foi um corrupto mais ou menos, como uma grávida mais ou menos. Outro procedimento que desmoralizou o Legislativo foi o gesto do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB) e do presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B) promulgando a emenda constitucional que põe fim a verticalização. Note-se que ao instituir de novo a mixórdia partidária, mesmo contrariando a decisão do TSE, aquelas autoridades violaram o Estado Democrático de Direito. Esse processo - onde a deterioração da moralidade pública é evidente, o desrespeito à Lei por quem deveria zelar por ela uma constante e o fortalecimento do Executivo uma realidade - faz lembrar o pensamento do companheiro frei Betto, quando este afirmou que "o PT estava no governo, mas não ainda no poder". Ao mesmo tempo, numa época em que proliferam na América Latina ditaduras populistas de esquerda disfarçadas de democracia, é significativa a visão do chanceler de fato, Marco Aurélio Garcia: "o último ano desse governo deve ser entendido como primeiro ano do próximo". Mais ainda, no documento reservado do PT, que está sendo elaborado para a campanha da reeleição de Luiz Inácio, Conjuntura, Tática e Política de Alianças, Valter Pomar sentencia: "o período 2003-2006 deve ser entendido como uma transição necessária de um velho Brasil para um novo projeto nacional de desenvolvimento" (0 Estado de S. Paulo, 9/3/06). O documento - que seria o avesso da Carta ao Povo Brasileiro, de junho de 2002, e prega a intervenção no Banco Central e outras medidas na condução da economia - tem tal teor de radicalização que preocupou o Planalto, segundo o jornal já citado. Naturalmente os autores enfatizam o PSDB como o inimigo por excelência, mas admitem siglas que integram as bases do governo. É assim que se chega ao poder. Entretanto é bom lembrar, que se no governo o PT tem dado mostras de amoralidade e incompetência, imagine se chegar ao poder quando nada mais poderá cerceá-lo. Aí é que os eleitores vão ver o que é Plano B. Nota do Editor: Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
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