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Ano 2 - Nº 15 - Ubatuba, 20 de Dezembro de 1998
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Painel Jurídico
· Da limitação constitucional dos juros
    Dr. Roldão Lopes de Barros Neto
    http://www.psi.com.br/~roldao
    roldao@psi.com.br


Devemos inicialmente lembrar que a norma constitucional contida no artigo 192 da Constituição Federal é clara, de plena eficácia e de autoaplicabilidade pois determina que: As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze pôr cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar.

Logo, a soma dos juros pactuados e outras verbas remuneratórias, incluindo o que exceder à correção monetária na comissão de permanência, não pode superar a casa dos doze pôr cento ao ano, nos exatos termos da norma constitucional.

Muito se ouve falar que o SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL firmou a posição de que os juros constitucionais dependiam de regulamentação por lei ordinária (ADIn nº 4), mas não se fala que, quando da prolação desse julgamento, a Constituição estava em vigor há pouco tempo e ainda eram, plenamente válidas suas Disposições Transitórias.

Admitindo-se a necessidade de Lei complementar, só para argumentar, concluiremos que o Poder Legislativo, não teria feito a sua parte e quando tentou, sete anos depois, através dos Senadores, o Poder Executivo Federal conseguiu refrear tal iniciativa na Câmara de Deputados. Assim, é patente que regulamentação nunca será feita, obrigando-nos a buscar a prestação jurisdicional individualmente pois ou se dá eficácia ao dispositivo constitucional, através do Judiciário, ou se terá um caso manifesto em que a omissão do legislador ordinário (poder constituído) vale mais do que a afirmação clara do poder constituinte.

Oportuno salientar trecho do estudo doutrinário do ilustre Jurista PAULO HENRIQUE MATTA MACHADO que esclarece-nos com profundo saber que:

"a proibição constituinte da cobrança de juros insuportáveis traduz decisão política do povo brasileiro que revoga a indecorosa legislação anterior ao advento da Constituição, cujo resultado foi, sem sofisma, o de sepultar, de vez, o monopólio da usura em nosso Pais, até então explorado com a cupidez pantagruélica dos banqueiros".

Pronunciamento relevante é o do JUIZ FEDERAL HUGO DE BRITO MACHADO que assim se manifestou:

"Do ponto de vista jurídico, portanto, nada impede a aplicação da norma contida no par. 3º do Artigo 192, da vigente Constituição. Também do ponto de vista econômico não nos parece inviável o limite constitucional em foco. O sistema financeiro paga aos aplicadores em cadernetas de poupança apenas 6 % de juros.

Tem-se, portanto, que o titular do capital está recebendo apenas a metade do rendimento situado no referido limite. Seria absurdo sustentar que intermediário entre o proprietário do capital e os que o utilizam nas atividades produtivas tem direito a remuneração duas vezes maior, pela simples intermediação.

Por tudo isto, concluímos que a proibição , contido no par. 3º do Art. 192, da vigente Constituição, da cobrança de juros reais superiores a 12% ao ano é norma jurídica vigente e auto-aplicável. Assim, qualquer pessoa prejudicada pelas condutas violadoras dessa norma pode utilizar os instrumentos processuais que a ordem jurídica lhes assegura, para fazer valer o direito de não pagar juros superiores ao citado limite".

(Repertório IOB Jurisprudência 2/89 - 1/1839)
De estudo doutrinário recente, elaborado pelo JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SANTOS, Dr. JOSÉ WILSON GONÇALVES a respeito dos juros, extrai-se o seguinte pronunciamento:

"Sobre este tema também revejo o posicionamento, visto que antes acompanhava a orientação do Egrégio Supremo Tribunal Federal.

A taxa anual máxima de juros, prevista no art. 192, § 3º, da Constituição Federal, deve ser observada independentemente da expedição de normatividade integradora, pois se cuida de norma constitucional de eficácia jurídica plena, aplicabilidade imediata, em que pese o respeitoso entendimento da Augusta Corte, guardiã maior do direito constitucional, que, entretanto, não tem efeito vinculante.

Prefiro o conceito singelo do direito civil, e justo, principalmente diante do teor do § 3º supra, aos complexos do direito econômico, de modo que considero juros reais toda e qualquer remuneração do mútuo. A correção monetária não é pena nem rendimento, ou modalidade de encargo, mas o próprio capital. De modo que não constitui verba remuneratória.

A comissão de permanência tem natureza mista. Segundo entendimento pretoriano predominante funciona como substitututiva da correção monetária, inadmitindo-se cumulação das duas verbas, a se inferir, desse raciocínio, que é composta de fator recompositivo do poder adquisitivo da moeda, corroído em virtude do processo inflacionário, e de fator remunetário, no que sobejar. A comissão de permanência, no mais, é tida como quantia compensatória pelo atraso no pagamento do débito vencido, consoante prevê a Res. BCB nº 1.129, de 15.05.86, itens I e II.

Logo, a soma dos juros pactuados a outras verbas remuneratórias, incluindo o que exceder à correção monetária na comissão de permanência, não pode superar a casa dos doze por cento ao ano, nos exatos termos da norma constitucional.

Tal dispositivo constitucional preceitua: "As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar" (grifei).

Ainda na RT supra, a seguinte ementa: "O limite constitucional dos juros, sendo auto-aplicável a norma do art. 192, § 3º, da CF, alcança todas as transações de realização de crédito bancário. Norma que não se restringe às relações envolvendo contratos de mútuo ou financiamento".

Segundo ensina, ademais disso, o Professor JOSÉ AFONSO DA SILVA, toda norma constitucional tem desde logo o efeito revogador, o que vale dizer que o ordenamento infraconstitucional preexistente que venha a colidir com a norma constitucional, de aplicabilidade imediata ou mediata, pouco importa, não encerra recepção pela Constituição, perdendo, consequentemente, a eficácia, a exemplo da legislação específica que permite às instituições financeiras a cobrança de juros acima do limite de 12% ao ano. Certo que o entendimento da Suprema Corte se funda na necessidade de a lei conceituar os juros reais, mas conforme discorri acima a própria norma constitucional estipula os elementos a inferi-los, o que desnecessitaria de regulamentação.

O Congresso Nacional, a quem incumbe a emissão da normatividade conceituadora de juros reais, necessária conforme a Suprema Corte, além do mais, está em mora, por força de mandado de injunção (MI-430/DF, DJ 18.08.95, pp. 24.893), competindo ao juiz, pois, no efetivo controle incidental da constitucionalidade de atos normativos, no caso inconstitucionalidade por omissão, dirimir concretamente o conflito de interesses posto-lhe a solução, com a edição, segundo sua cultura e consciência jurídicas, do conceito a viabilizar o direito do jurisdicionado."

Portanto, é necessário repensar a conclusão tirada da decisão do STF. Está assim em pleno vigor a limitação das taxas de juros a 12% ao ano.Fim do texto.
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