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Ano 2 - Nº 19 - Ubatuba, 18 de Abril de 1999 |
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UbaWeb - Muitos relacionam o aumento da criminalidade à elevação da pobreza e miséria entretanto, em muitos países árabes, onde predomina o islamismo, existe um alto índice de pobreza e um índice de criminalidade nulo. Afinal, existe um vilão da criminalidade? Belisário - Não sei se se pode falar em vilão da criminalidade. Mas, seguramente, há fatores que muito contribuem para ela. O desenfreado crescimento das grandes cidades, sem acompanhamento de adequado planejamento urbano, com a favelização das periferias; a conseqüente ausência de espaços planejados de convivência e de lazer; deficiência de eficientes mecanismos para uma melhor distribuição da renda; o fenômeno da desagregação familiar; a crescente vulnerabilidade da sociedade à influência das drogas (álcool, inclusive); os fortíssimos apelos da sociedade de consumo (só é bom ou tem sucesso quem fuma..., ou quem usa..., ou quem veste...); atitudes de falta de solidariedade ou de cidadania, em relação à pobreza ou à corrupção, entre outros, são fatores a serem citados. É possível fazer alguma coisa? Claro que é. Algumas dessas possibilidades já acontecem no Estado de São Paulo. Mais investimentos na polícia (carros novos, coletes, armas, mais policiais na rua), criação de mecanismos de aproximação do Estado e da cidadania (tipo polícia comunitária, centros de integração da cidadania, jornadas da cidadania, aumento dos espaços de lazer na periferia, ocupação dos espaços públicos pela comunidade nos horários em que tais equipamentos não são utilizados), maior participação do empresariado nos programas públicos, estímulos à educação (nenhuma criança fora da escola) e redução drástica da evasão escolar. São os exemplos que me ocorrem. Em conclusão. A pura associação de pobreza com criminalidade não resiste. O Brasil é um país profundamente honesto, ainda que pobre. Basta considerar sua população (160 milhões) em comparação com o número de pessoas presas ou procuradas pela Justiça (aproximadamente 300.000)... UbaWeb - Como pode ser explicada a aparente contradição entre a posição do governo frente aos direitos humanos dos criminosos e das vítimas e suas famílias? Belisário - Não vejo contradição em defender direitos humanos, até para as pessoas detidas ou acusadas de algum crime. É bom que todos entendam que há direitos especificamente para tais situações. O direito à ampla defesa, o direito a um julgamento justo, a um tribunal imparcial, a proibição da tortura etc. A resposta da sociedade ao crime deve ser uma resposta fundada na lei e não fundada na vingança. É pelo nível da resposta da sociedade ao crime que se vê o patamar de civilização daquela sociedade. A resposta social não pode se igualar à barbárie do crime. No entanto, sempre se cobrou do chamado mundo dos direitos humanos (conjunto de pessoas e organizações que priorizam a promoção e a proteção dos DH) atenção mais determinada para a dramática situação das famílias carentes que perdem, por ação criminosa, seu provedor, aquele ou aquela que fazia a ligação com o mundo do trabalho e por extensão com o mundo da saúde, do lazer etc. A situação normal de tais famílias já é bastante difícil e, com o crime, torna-se desesperadora e exige medidas prontas de correção. O legislador federal, no entanto, não criou a lei que a Constituição exigia. Mas, uma parceria bastante criativa entre o Estado de São Paulo, organizações não governamentais, como a Federação do Comércio e as universidades, como a PUC/SP e a FMU, redundou no Centro de Referência e Apoio à Vítima (CRAVI), inaugurado em julho de 1998. O CRAVI (rua Barra Funda, 1032 - SP, fones: 011 3666-7778 e 011 3666-7334) oferece serviços de apoio social, psicológico e jurídico às vítimas. Inaugura uma nova maneira de recuperar o estado sócio-psicológico da família vitimizada, agindo para colaborar na superação do trauma e na reconstrução das suas relações pessoais e profissionais. Assim, pelo menos no Estado de São Paulo, no Governo Covas, estamos tratando de diminuir o grau de sofrimento dessas pessoas. É a meta do CRAVI. UbaWeb - A possibilidade de votar não daria ao preso um direito de reivindicação política que obrigaria os governantes a cuidar com maior interesse da legislação penitenciária, e das condições de vida dos encarcerados?
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Belisário - O preso só teve suprimida a sua liberdade. O seu direito ao voto permaneceu íntegro. Mas, ele não é respeitado. Tanto como membro do Conselho Penitenciário do Estado (de 1991 a 1994), quanto como Secretário da Administração Penitenciária (janeiro a julho de 1995) efetuei gestões junto à Justiça Eleitoral, nesse sentido. Sem sucesso. De qualquer forma, há uma legislação avançada em matéria de execução penal (Lei de Execução Penal). Ela precisa ser cumprida, não melhorada. Há alguns pontos que entendo devam ser entendidos. A sociedade não precisa necessariamente de mais leis penais. Necessita de menos impunidade. A perda da liberdade deve ser reservada para os casos em que o convívio da sociedade com o criminoso seja impossível ou impróprio. Em determinadas hipóteses o atingimento do bolso do infrator pode ser mais eficiente, com maiores efeitos de prevenção específica e geral. Para isso, entendo que deve ser melhor pensada a figura da "perda de bens" prevista na Constituição, mas ainda pobremente explorada em nossa legislação penal. As penas alternativas devem ser pensadas como possibilidade de impedir que pessoas que não necessitam da prisão prestem outras formas de reparação à sociedade. Hoje, não há pena alternativa à prisão. As penas ditas alternativas, são alternativas a outras formas de cumprimento da pena em liberdade. De qualquer forma, São Paulo leva avante um grande programa de reforma de seu sistema penitenciário, com criação de mais 19.000 vagas, com a futura desativação do conjunto Carandiru (a ser destinado a atividades de profissionalização e com o desafogo dos distritos policiais, que não mais abrigarão presos condenados). UbaWeb - Que substituto haveria para a censura, mal por todos repudiados, como instrumento para diminuir a influência e os apelos da mídia junto às comunidades economicamente mais desfavorecidas enquanto convite para viver no mundo que, na realidade, a sociedade lhes nega e que é aquele das novelas e da propaganda, que exaltam o modo de vida e produtos a cujo acesso o pobre só chegara através do crime? Belisário - A pergunta critica a censura, mal que todos repudiam. Mas, sugere reflexão sobre o controle democrático da "mídia" e da propaganda. Em relação à propaganda já existe o Conselho de Auto-Regulamentação Publicitária (CONAR), com poderes de suspensão da peça publicitária, entre outros. De outra parte, o Código de Defesa do Consumidor defere aos Procons competência para autuar em caso de propaganda enganosa ou abusiva, o que tem sido feito. Em relação à "mídia" estão sendo discutidos formas novas de auto-regulamentação. Os excessos começam a ser objeto de ações do Ministério Público. Não nos esqueçamos que televisão e rádio são objetos de concessão e a violação dos direitos humanos poderá ser considerada como ofensa às regras da concessão, daí resultando sua revogação pelo Congresso Nacional. São algumas pistas para reflexão sobre o problema. UbaWeb - Como a região do litoral norte de São Paulo, principalmente Ubatuba, poderia evoluir na conquista dos direitos de cidadania de sua população, tendo em vista a deficiência dessa região em recursos materiais e humanos? Belisário - A Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania tem alguns programas que atingem nossa Ubatuba. O Instituto de Pesos e Medidas (IPEM) realiza várias operações de interesse da cidadania do Litoral Norte, como por exemplo a Operação Verão. A Fundação Procon pode dar suporte técnico para a defesa do consumidor, assessorando o Procon local. A Secretaria pretende construir o novo Fórum de Ubatuba. A Prefeitura local está estudando a possibilidade de participar com 20% das obras. Dependendo da resposta, já será dada seqüência ao convênio para o início das obras. Há outros programas de municipalização em curso, em relação à própria formação de agentes da cidadania, criação de programas municipais de direitos humanos etc. De novo, agradecendo o espaço da entrevista, renovo o convite para todos visitarem nosso site na Internet em www.justica.sp.gov.br. ![]() |
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Ano 2 - Nº 19 - Ubatuba, 18 de Abril de 1999 |
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