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Ano 2 - Nº 19 - Ubatuba, 18 de Abril de 1999
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Painel Jurídico
· A reforma do Judiciário
    Dr. Roldão Lopes de Barros Neto
    roldao@psi.com.br
    http://www.psi.com.br/~roldao

A reforma constitucional, na parte que pretende atingir a Magistratura e o Judiciário está a ensejar um debate profundo acerca do delineamento traçado pela Constituição de 1988 e do que se afigura, tal poder, perante a sociedade brasileira.

Num primeiro momento é bom deixar claro que os juizes, apesar de receberem seus vencimentos do Estado terem, dentre suas obrigações, de servir ao povo e ingressarem na carreira por concurso público, não se admitem como servidores públicos, preferindo serem qualificados com parte integrante da estrutura do Poder, ou seja, "agentes políticos, integrantes dos órgãos componentes do sistema judiciário, partes do todo denominado Poder do Estado".

É indiscutível que, no exercício de suas funções, os magistrados solucionam os litígios que se lhes apresentam mas também, interpretam e dão aplicação prática às normas Constitucionais e nas demais Leis de modo a consagrar a paz social.

Neste sentido, é que se justifica a mantença e garantia constitucional da independência da manifestação das convicções e das decisões dos juízes.

Entretanto, somos da opinião de que o Poder Judiciário não poderia estar dependente, financeiramente, do Poder Executivo e pugnamos que tenha sua autonomia própria, com receitas advindas das custas/emolumentos, submetidas, as contas, a ampla publicidade e ao julgamento de Tribunal de Contas, bem como a implantação/reajustamento/aumento das custas/emolumentos, submetidas à aprovação de pelo menos duas casas legislativas (Estadual/Municipal ou Federal/Estadual).

INGRESSO, VITALICIEDADE E PROMOÇÃO

Certamente o modo de ingresso na Magistratura, nos diversos graus, e os critérios para ascensão aos Tribunais, devem ser revistos. Somos favoráveis ao sistema inglês onde só há acesso à judicancia após longos anos de exercício da advocacia, tornando a magistratura, verdadeira carreira jurídica a ser exercida por quem já demonstrou méritos.

Hoje, o jovem é atraído para a magistratura ou para o Ministério Público pelos salários e pela estabilidade mas é cediço que almejam, após a aposentadoria, o exercício da advocacia.

Antes julgam para depois submeterem suas teses a julgamento dos mais jovens? Não estaria havendo um erro de silogismo?

Não seria mais saudável submeter-se as jovens teses ou as teses dos jovens ao crivo dos mais vividos que além da cultura específica ainda podem usufruir da experiência da vida?

O vitaliciamento, a inamovibilidade, e a irredutibilidade remuneratória, não só seria incentivo para ingresso ou ascensão como efetiva garantia de independência e imparcialidade nas decisões.

Restaria, portanto, tão somente a criação de critérios adequados de aferição de desempenho e conduta (na vida do profissional do direito) que pudessem acarretar a censura total, culminando, inclusive, com a perda do cargo ou da carteira do Órgão de Classe o que, de um lado ou de outro, exorcizaria os maus profissionais do seio societário.

Um critério que entendemos interessante é o de eliminação do concurso público com a substituição pela inscrição na Escola de Magistratura, ou seja, após alguns anos de efetivo exercício profissional, por exemplo 10 anos, o candidato ao exercício da magistratura (seja ele advogado, promotor, procurador, delegado, escrivão, oficial maior ou outros em que haja necessidade de efetivo manuseio do Direito) poderiam se inscrever na Escola de Magistrados.

Realizariam o curso normalmente e submeter-se-iam a algumas avaliações, sendo certo que aproveitados seriam os de maior/melhor aproveitamento do curso.

Tal forma de proceder traria de volta a saudável imagem de que o Judiciário é um poder solene composto de magistrados com larga experiência na sociedade, extremamente preparados e de uma cultura ímpar.

Decerto não se estaria a excluir a inspiração do novo em detrimento de critérios nem sempre precisos, mas também não se estaria excluindo, a necessidade da experiência no trato das situações sociais, porque também do conviver os problemas, decorre a sabedoria para evitar outros conflitos. O ingresso na Magistratura, pois, há que passar, necessariamente, pelo crivo da vocação e da experiência, que não se confundem, com o da idade, até porque algumas pessoas, mais velhas, poderiam pensar em ascender na carreira jurídica, procurando o exercício da magistratura, sem qualquer experiência forense, enquanto outros mais novos, estariam mais preparados ou vocacionados, por terem convivido, profissionalmente, muito mais tempo no trato com os problemas decorrentes da vida em sociedade.

Assim, fica a sugestão de, eliminando-se o concurso público, adaptar-se o modelo no sentido de que o ingresso na judicatura, apenas ocorresse com a aprovação do candidato pela respectiva Escola da Magistratura, podendo, enquanto aluno   e  com  vistas a  avaliação  de  aproveitamento,  receber
funções judicantes menores como assistir os Juizes nas audiências; presidir aquelas apenas conciliatórias, colaborar nos despachos, e mesmo poder assumir funções maiores nos Juizados Especiais, adquirindo, assim, com o convívio, a experiência necessária, ao mesmo tempo em que confirmar-se-á, de forma inequívoca , a necessária cultura e vocação para a Magistratura.

Aprovado, tal qual ocorre na ascensão para os Tribunais, dos quais supõe-se haver a necessária experiência forense, o vitaliciamento seria efetivado com a posse, sem se aguardar novos decursos de tempo.

Com tal modelo, o candidato sujeitaria as suas capacidades, a sua vocação e a sua conduta, num exame inequívoco de suas qualidades a uma verdadeira Escola da Magistratura, e não mais a meras perguntas e respostas de cunho teórico. Assim, a aprovação pela Escola de Magistratura habilitaria ao ingresso na Magistratura plena, inclusive com o vitaliciamento a partir da posse, como ocorre nos Tribunais, em que os critérios de experiência são apurados com base em critérios objetivos de idade e/ou de tempo de carreira ou atividade profissional, aliados à apuração vocacional e aferimento cultural.

Julgamos que os pressupostos experiência e vocação são essenciais. Ao Magistrado, se existente o pressuposto da vocação, suplantadas estarão todas as dificuldades da carreira. E não é ilógico afirmarmos que um bom Judiciário depende de bons Advogados e de um preparado e consciente Ministério Público, nas atividades que lhes são próprias.

Por sua vez, se a questão colocada é no sentido da necessidade de aprimoramento, certamente seria melhor limitarmos o espectro de candidatos aptos a ingressarem nos Tribunais àqueles cuja inteligência e experiência suplantem as vontades pessoais, o que só nos será possível mercê de aferição vocacional.

O Judiciário apenas será espelho para a sociedade quando esta tiver a convicção insofismável de que os Juízes (seres sábios e experientes) apenas temem a Constituição e as Leis com ela conformes, julgando as causas que lhe sejam submetidas segundo suas convicções no interpretar o Direito para aplicar a Justiça. Para tanto, não pode o Juiz sequer recear desagradar Poderes outros ou Tribunal que lhe seja superior, sob pena das garantidas individuais da cidadania restarem relegadas a segundo plano.

IRREDUTIBILIDADE DE SUBSÍDIOS E PROVENTOS

Questão, também, que merece reflexão, é a da justa remuneração dos Magistrados. O tema é complexo, porque pode confundir-se com interesses corporativos mas que, em verdade possuem um grande cunho de segurança social. A sociedade possui imenso interesse de que os Juízes vivam com suas famílias em situação condignas, despreocupados com orçamentos familiares e dívidas, e nunca tentados a receber qualquer propina para julgar.

Assim, a questão de fixação e irredutibilidade de remuneração deve ter relevância e ser objeto de estudo específico, ante sua especificidade e subjetivismo próprios. É certo que aquele que restar aprovado na Escola de Magistratura não poderá auferir menos do que percebia em suas atividades anteriores, sob pena de não só afrontarmos preceito constitucional como também por empreendermos riscos de insatisfação profissional decorrente da insuficiência remuneratória.

Ao se pensar em remuneração, como todo bom brasileiro, de imediato se revela a dúvida concernente a aposentadoria. Entendemos que o Magistrado, tal qual o sacerdote é vocacionado e portanto, não pode estar sujeito a aposentadorias precoces, seja porque está em plena e lúcida atividade, seja por pouco tempo de exercício. Em vários países vigora a regra de que o Magistrado, sendo vitalício, exerce suas atividades até a morte, ou enquanto bem servir, assim traduzindo enquanto tiver condições de exercer plenamente suas atividades judicantes.

Sob tal ótica, raciocinamos que, a partir de uma determinada idade (70 ou mais), seja o magistrado submetido a exames médicos de capacitação física para o labor, com a faculdade do Tribunal que integre ou a que esteja vinculado declarar sua incapacidade por idade para a função, quando dar-se-á, sua aposentadoria. Tal regra tem as vantagens de permitir que Juízes ainda lúcidos e plenamente capazes colaborem com suas inteligências no aprimoramento do Judiciário e da distribuição da justiça, independentemente de sua idade cronológica, ao tempo em que se evita a possibilidade de Juízes já debilitados em saúde permanecerem por insistência na Magistratura ativa, em verdadeiro constrangimento de seus pares, sob a advocacia de que parar de trabalhar é definhar para a morte.

Nota do Editor: o autor é advogado militante, titular de duas bancas de advocacia, uma em São Paulo outra em Campinas; Diretor de dois jornais de distribuição gratuita, um em São Paulo e o outro em Campinas; detém, vários cursos de pré e pós-graduação; proferiu várias palestras jurídicas, inclusive para leigos e é autor de livros jurídicos, escritos em linguagem acessível, com intuito de transmitir experiências técnicas, profissionais e de vida a um maior número de pessoas, independentemente de sua extensão cultural, sendo relevante citar-se sua última obra intitulada "Anotações Doutrinárias e Jurisprudenciais sobre: Alimentos", que esgota, de forma atualizada, o assunto relacionado com as Pensões Alimentícias no Brasil e pode ser encontrada pelo fone: (019) 233-3229.Fim do texto.
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