Em artigo anterior com o mesmo título mostrei a contradição que algumas pessoas observam, e apontam como problemática, na relação entre a Igreja e a opinião pública. De fato, estamos habituados ao comando do consumidor sobre o mercado (uma empresa que não atente às exigências do seu público está fadada ao fracasso) e sabemos da importância dos anseios do eleitor sobre a conduta dos políticos. Nesse sentido, para não se equivocarem, as empresas promovem pesquisas de opinião com o intuito de conhecer e atender às expectativas de seus clientes. E as lideranças políticas, antes de iniciarem campanhas eleitorais, tratam de saber o que seus liderados querem ouvir para afinarem os discursos com o diapasão que tais informações lhes fornecem. Se a conduta das empresas se justifica plenamente, no que concerne às lideranças políticas não é bem assim. A função do líder não é a de enfiar o dedo na boca, esticá-lo ao ar para ver de que lado sopra o vento da opinião pública e enfunar suas velas para seguir com ele. A função do verdadeiro líder é a de sinalizar a direção certa, apontar caminhos, propor soluções. O contrário disso, embora produza vitórias eleitorais, não tem levado a sucessos na condução das políticas públicas. Assim se entende e justifica plenamente a atitude do Magistério da Igreja. Embora ouvindo e conhecendo as opiniões talvez dominantes, mesmo sabendo que por vezes a orientação que adota as contraria, ainda que perca seguidores, a Igreja não pode renunciar a seu papel de mestra. Ela não se pode moldar ao que as pessoas pensam. Ouve-as, sim, mas se for o caso, ensina diferentemente. Nesse sentido, a atitude de Cristo, citada no artigo anterior, resulta bem esclarecedora. Ao anunciar-se como alimento para o mundo, muitos de seus seguidores o abandonaram. Restaram os Doze. E também a eles Cristo se dirigiu perguntando se queriam ir embora. Vale dizer: era-lhe preferível ficar só a renunciar à verdade e à sua missão. O mesmo ocorreu quando Henrique VIII solicitou ao papa Clemente VII que lhe concedesse o divórcio. A recusa deu origem ao Cisma da Inglaterra, no qual se afastaram não alguns fiéis, mas todo um império que era católico desde a extraordinária obra evangelizadora de Santo Agostinho de Cantuária, no século VII. A Igreja, portanto, procede como a bússola que aponta ao norte e não pode, salvo severo distúrbio, deixar de o fazer. Ela não é, sequer, a dona do Norte que lhe é dado pela Revelação e pela Tradição. Segue-a quem quer, sem qualquer obrigação de o fazer. Nota do Editor: Percival Puggina é arquiteto, político, escritor e presidente da Fundação Tarso Dutra de Estudos Políticos e Administração Pública.
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