· O Renascer de Onhamoçare
Herbert Marques
hmarques@iconet.com.br
Nos confins da amazônica vivia uma linda princesa cuja beleza corria os sete cantos da selva, estonteando a todos aqueles que se aproximavam dela e conseguiam ver seu rosto de pele morena e cabelos negros e longos, cujo semblante inspirava uma tranqüilidade nunca vista em todo aquele universo verde de vida abundante.
Onhamoçare corria a floresta exibindo seu belo filho, não menos belo que ela, fruto certamente do cruzamento com um deus que somente ela conhecia, mas cujo produto era de uma beleza que causava inveja em todas as mães que o via, dado a luz que resplandecia de todo o seu corpo a iluminar suas formas humanas, mas que somente ficavam nas formas, porque todos sabiam, ou quase todos, tratar-se de um pequeno deus da mais pura linhagem, produzida no olimpo das selvas amazônicas.
A inveja que causava foi tanta que certo dia as mães da região se uniram e aproveitando uma distração da mãe-deusa que dormia, mataram seu filho para que não mais existisse aquele esplendor de criança a ofuscar seus rebentos.
Ao despertar e encontrar seu filho morto, Onhamoçare derramou todas as lagrimas que tinha dentro de si, sem contudo sentir ódio de seus ofensores, sentimento que nunca conheceu em toda a sua existência de mãe-deusa ou simplesmente de deusa. Pelo contrário, retirou do pequeno e inerte filho seus dois olhos, plantando-os como duas sementes para que desse algum fruto que pudesse ser útil a todos os humanos da floresta.

Logo a seguir as sementes germinaram e de uma delas nasceu uma planta que não produziu frutos. Da outra, nasceu o guaraná, fruto que passou a compor a alimentação daqueles que necessitam de energia para vencer as grandes lutas, sejam elas físicas ou, principalmente, da própria mente, quando esta fraqueja leva as pessoas para a prática da inveja.
Nota do Autor: Esta lenda pertence ao imaginário da tribo Amazônica Sateré Maué que dedica o dia 5 de junho para sua deusa Onhamoçare, nome que foi dado a Yolanda, que nasceu neste dia, filha de Márcia e Ney, um casal que sempre procurou viver longe desta fraqueza dos homens. 
|
|
· Mais vale a fé do que o pau da barca
Fátima Aparecida Carlos de Souza
articulista@ubaweb.com
Firmino era um barqueiro que tinha como família um papagaio e alguns pertences que lhe eram muito caros. Sua vida era fazer fretes de cidade para cidade com seu estimado barco, herança de seu velho pai.
Um dia, ao aportar na Prainha, hoje praia do Matarazzo, onde um esperançoso porto fluía, uma comitiva de senhoras beatas fretaram seu barco para levá-las até Iguape, onde boatos, quase que verdadeiros, pregavam a benevolência do santo ao realizar vários milagres.
Sabendo da viagem, um caboclo procurou Firmino para fazer uma encomenda não muito comum para um barqueiro. Pediu-lhe que trouxesse um pedaço da madeira da cruz de Bom Jesus de Iguape para espantar o demônio que tinha se apossado de sua mulher. Somente um amuleto dessa madeira bendita poderia fazê-la ficar livre dessa perturbação. Pagou adiantado, para que nada saísse errado.
A viagem foi tranqüila até Iguape. Lá chegando, desembarcou as passageiras e, como elas só voltariam no dia seguinte, não pensou duas vezes, foi visitar umas velhas conhecidas no bordel da cidade.
No outro dia, ainda meio atordoado com a farra da noite anterior, abasteceu o barco, pegou os passageiros e rumou de volta para Ubatuba. Quando chegou em São Sebastião é que Firmino se deu conta do esquecimento. Se deu conta de que houvera esquecido a encomenda. Não teve dúvidas, passou a mão no canivete, tirou um pedaço de madeira do barco, arrumou direitinho, embrulhou em um pedaço de papel de seda e deixou respeitosamente num lugar seguro. Ao chegar no porto da Prainha, já estava lá o caboclo à espera de sua encomenda tão preciosa. Firmino entregou-lhe o embrulho, contando da dificuldade de obter a encomenda, uma vez que muita gente vigiava o santo milagreiro.
Dias depois, quando se arrumava para mais uma viagem, se deu com o caboclo da estranha encomenda que não sabia como agradecer a Firmino o bem que lhe tinha proporcionado. Sua mulher voltara a ser o que era sem perturbação mais nenhuma. Firmino caiu na gargalhada e não se dava conta de sua tamanha travessura quando olhou na proa do barco e viu o demônio dando risada dele e disse: - É meu caro, mais vale a fé do que o pau do barco. 
|