É muito prazeroso estar trocando conhecimento, ainda que cada qual defendendo as suas razões, no intuito de nos aproximarmos do mais real possível, principalmente em se tratando de Carlos Rizzo, de quem conheço a capacidade intelectual e o discernimento no trato das questões, quero deixar empenhado por ele o meu carinho e respeito que sempre foi recíproco. Muito me valoriza e orgulha quando você, meu caro amigo, lembra nas suas entrelinhas da minha tradição com o mar e a dedicação que tenho com a pesca, mas discordo do argumento que isto me levou a uma ilusão, deformando assim a minha capacidade de observação, portanto, volto a afirmar, o biguá nunca fez parte do cenário de Ubatuba. O fato do ornitólogo ter fotografado o biguá em Ubatuba não garante nada porque é normal em determinada época do ano aparecer em nossa região pingüim e com o passar do tempo alguém através de foto insistir que esta ave já habitou a nossa região ou ter o homem sempre pertencido ao sistema lunar, quanto ao relato do ex-morador da Ilha dos Pescadores que afirma que na sua infância admirava-se com a capacidade de mergulho dos biguás em 1980, disso eu não posso duvidar. Mas há quem afirme também, que já viu disco voador, lobisomem, há até quem acredite em duende; quem sabe, não seja apenas o delírio imaginário de uma mente fértil. É equivocada a comparação quando se faz a leitura da oferta de alimento, é lógico que antigamente era maior, pois o rio tinha uma vida ativa, como já relatamos no episódio anterior esta falência só ocorreu após a chegada dos cormorões. Quanto à indagação se na época jogava-se tanta limpeza de peixe igual aos dias de hoje, eu não tenho dúvidas, porque o comércio de pescados dos anos sessenta até esta data caiu no mínimo 70%; para maior clareza o peixe era comercializado na rua Baltazar Fortes e toda a limpeza era jogada no rio, diferente dos dias atuais, em que os caminhões de lixo recolhem todos os dias. A segunda pergunta do mesmo parágrafo podem ficar sabendo, não tínhamos tantos pescadores, afinal à população cresceu, mas a produtividade era bem maior, pois Ubatuba aparecia no Estado de São Paulo com o segundo lugar de desembarque de pescado tendo uma produtividade entre quatro e cinco mil toneladas ano. Também não vejo com esta ótica, que o biguá encontre alimento com maior facilidade em ambiente pouco saudável, porque a base de sua alimentação é peixe e de preferência vivo. Dizer que aves, animais e insetos não infestam ambientes que não tenha alimentos não é novidade, nem eu... O que ocorre nos rios do lado norte do município com a baixa freqüência do biguá não é porque o rio é ou deixa de ser poluído; se observarmos o Rio Grande acima da ponte da Rio-Santos, você não os encontra e em nenhum rio de uma determinada parte para cima e isto tem uma explicação: 1º - porque a vegetação cobre todo o barranco do rio e o lambari, camarão, jundiá e outros vivem na maior parte do tempo embaixo destas ramadas e o biguá tem dificuldade de alçar vôo. Além disto, para quem transita pela Rio-Santos, é comum deparar na estrada com uma ave muito conhecida nossa: o gavião-pato. O biguá é uma ave que voa baixo, não tem velocidade em seu vôo e pouca habilidade, então se torna uma presa fácil para o gavião, além disso, ao se empoleirar para o pernoite junto ao local que tenha uma vegetação densa com pouca luminosidade, também se transformaria em vítima vulnerável para os animais de hábitos noturnos e o seu instinto de sobrevivência faz com que ele permaneça nas desembocaduras dos rios, próximo do homem, mas seguro. Volto a repetir, o cormorão é conseqüência, porque se fosse ao contrário, o peixe teria comido o cormorão, afinal o peixe é o dono da casa e o cormorão, o invasor; quanto ao tuba, ele não está se extinguindo, está tendo uma concorrência desleal, que acaba por dificultar sua forma de vida. Realmente, o homem precisa ouvir o que a natureza nos diz e está nos assinalando que quando ela por si só não consegue manter o equilíbrio, o homem por ser o único racional, não pode ser hipócrita, precisa ajudar. Vamos imaginar que as leis ambientais em algum dos seus artigos ou nossos sentimentos estabelecessem que o homem só pudesse vir ao mundo através do parto normal; imagine o desastre que iria provocar em uma considerável parcela da sociedade. Engana-se, quem pensa que os lanços de tainha acabaram, o que acabou foi à pesca folclórica; só para se ter idéia em 2007 um só barco capturou mais tainha que os pescadores artesanais da região sul e sudeste em toda safra; apenas houve uma mudança de comportamento, com outra dimensão e tecnologia; as toneladas de limpeza de peixe mencionadas em vosso texto não alteraram em nada; porque elas não existem mais, infelizmente vossa senhoria parece desconhecer as realidades do município, neste particular os biguás chegaram após a fartura; quanto ao defeso do camarão, o biguá não tem nada com isto, porque é o homem tentando manter o estoque da fauna marinha, como também fica impossível ao biguá engolir uma tainha adulta. O amboré nunca irá pedir socorro usando os artifícios do e-mail, mas, as futuras gerações correm sim o risco de não conhecê-los, enquanto o biguá continuar a destruir. Antonio Epifânio de Oliveira Textos relacionados: A solidão de um paraíso (Antonio Epifânio de Oliveira), Pedido de resposta (Carlos Rizzo), Pássaros do tempo (Antonio Epifânio de Oliveira) e Pássaros do tempo II (Carlos Rizzo).
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