Faz algum tempo que leio a revista O Guaruçá. Topei, algumas vezes, na seção Opinião, com os escritos de um tenente da Polícia Militar, Dirceu Cardoso Gonçalves, que é também dirigente de uma entidade chamada ASPOMIL, mas sempre fiquei na dúvida se ele somente emitia opinião própria, ou sua própria opinião era também a da revista. Minha dúvida continua. De qualquer forma, parei de ler a opinião do dito tenente, não por serem a favor ou contrárias à minha própria, mas por conta das inconsistências de seu texto, com formulações algumas vezes destituídas de sentido, e da irreprimível tendência a bater continência à direita, coisa que cansa. Mas ontem, excepcionalmente, perdi meu tempo lendo Reescreva-se 64, urgentemente! por causa do título de tom provocador. Novamente as mesmas inconsistências, a falta de sentido, a tendência irreprimível. Também tenho as minhas tendências irreprimíveis e uma delas, por preconceito, talvez, seja de completar para "aspone" tudo o que começa com "aspo". Começa o militar afirmando: "Passados 45 anos da Revolução de 64, ainda assim persistem perigosas idéias, motivações e posicionamentos que justificaram a ruptura institucional de então." Só se for na cabeça dele que 64 ainda seja considerada uma revolução. O que aconteceu (e isso hoje é mais do que pacífico) foi golpe: pareceu um golpe, tinha cara de golpe, e foi um golpe. Quanto às "perigosas ideias" que "justificaram" a ruptura institucional, é produção cerebral própria, destituída de argumentação consistente. Nada daqueles tempos "justificou", tornou justa, qualquer ruptura. A pérola, contudo, está um pouco mais adiante. A história nacional somente poderá fluir limpa e descomprometida se os líderes civis e militares de 64 fizerem uma coisa urgente: ajudem a desmontar fantasmas, mitos e mentiras. Valem as aspas: "A grande maioria dos líderes civis e militares de 64 está morta. Urge que os poucos ainda vivos, hoje despidos dos temores e interesses de então, ajudem a desmontar os fantasmas, mitos e mentiras - comuns a todos os momentos de confronto - possibilitando que a história nacional flua limpa e descomprometida." A história fluirá sim, limpa e comprometida com ela própria, mas certamente não terá ajuda de quem chama golpe de revolução, e pretende ser guardião do direito de futuras gerações: "sentimentos quase cinqüentenários, já superados pela linha do tempo, não podem continuar truncando o sagrado direito das novas gerações saberem o que realmente aconteceu. Remova-se a poeira da história e revelem-se os fatos sem a emoção do momento em que ocorreram." Bela revelação de "fatos", a do tenente. Já perdi muito do meu tempo, que anda escasso. Tenho os textos do Julinho, do Elias Guerra, do Marcos Guerra, do Herbert Marques, do Luiz Moura, que são consistentes e, concordando ou não com as ideias, vale a pena ler e, eventualmente, comentar. Elcio Machado (elciomachado@ubaweb.zzn.com), 55, é caiçara em construção.
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